Dia 20 de Fevereiro completaram-se vinte anos sobre o falecimento no New Hampshire da professora Donella Meadows (1942-2001). O seu nome está associado a uma obra que mudou a vida de muita gente da minha geração, o famoso relatório sobre os Limites do Crescimento (1972) apresentado ao Clube de Roma por uma equipa de investigadores do Massachusetts Institute of Technology. O livro foi um extraordinário sucesso. Publicado no mesmo ano em que se realizou a primeira conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano, em Estocolmo, foi traduzido em 29 idiomas e venderam-se nove milhões de exemplares. Logo em 1973, pela mão das Publicações Dom Quixote, surgiu a edição portuguesa. O sentido de oportunidade para a tradução do livro ficou certamente a dever-se ao pioneirismo de José Correia da Cunha, à altura Presidente da Comissão Nacional do Ambiente, a primeira entidade responsável em Portugal pela política pública de ambiente, fundada em Junho de 1971.
Ao contrário dos estudos prospectivos da década de 1960, nomeadamente, da autoria de personalidades como Herman Kahn, fundados num optimismo tecnológico inabalável, a obra de que Donella Meadows foi uma das responsáveis continha uma visão lúcida sobre os riscos do futuro, incluindo os aspectos sombrios que hoje fazem parte da nossa normalidade. Escrito no final dos «trinta gloriosos anos» de crescimento económico exponencial, um ano antes da crise petrolífera activada pela Guerra do Yom Kippur (Outubro de 1973), Os Limites do Crescimento procuraram traçar cenários para um século (horizonte temporal que mais tarde seria seguido nos estudos no âmbito do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas-IPCC). Donella foi uma pioneira na inovação científica. O estudo de 1972 utilizava pela primeira vez numa escala planetária, fora do campo estratégico e militar, a moderníssima metodologia prospectiva desenvolvida pelas ciências e tecnologias da informação. Donella e os seus colegas criaram um «modelo mundial» composto pela combinação dinâmica entre cinco factores fundamentais: população, produção alimentar, utilização de recursos naturais não renováveis, industrialização e poluição. As conclusões eram claras: se a humanidade continuasse a seguir pela via do crescimento exponencial irresponsável dentro de cem anos (em 2070) a nossa civilização atingiria uma situação de colapso irreparável.
Em 1972, não existia ainda o conceito de «desenvolvimento sustentável» (proposto pela primeira vez pelo IUCN em 1980 e popularizado a partir do Relatório Brundtland, em 1987). O conceito alternativo ao do crescimento exponencial a que Donella recorreu foi o de «equilíbrio global». Muitos dos adversários de Donella vão acusá-la de defender um modelo de «crescimento zero», quando, na verdade, a ideia de um equilíbrio global se aproxima muito mais da proposta de «estado estacionário», avançada por John Stuart Mill em 1848, que é hoje repercutida nos muitos autores que, face à catástrofe ambiental e climática em curso, defendem a urgência de concentrar o crescimento nas componentes imateriais e qualitativas da condição humana, de baixa ou nula pegada ecológica. Donella, com a sua inteligência e bondade, viajou a um futuro inóspito para o podermos evitar. Contudo, como sugeriu o nosso Almada Negreiros, entre as palavras que querem salvar a humanidade e os actos que a podem salvar de facto, vai uma imensa e misteriosa distância.
Viriato Soromenho-Marques
Publicado no Diário de Notícias de 27 de fevereiro de 2021